Helicópteros parecem se aproximar ferozmente, e o som quadrafônico espalha o rugido dos motores pelo estádio, enquanto explosões pontuam toda a extensão do telão. Uma réplica de um avião de guerra da Royal Air Force desce da torre de iluminação e colide com o muro, como se estivéssemos dentro de um Vietnã portátil.
Logotipos da Shell e da Mercedes caem no abismo junto a símbolos como a estrela de Davi, a cruz católica. Um retrato de Mao Tse Tung é estilhaçado na tela, assim como outros de aiatolás e generais. Nos tijolos do muro (de 137 metros de largura), fotos de centenas de retratos de perseguidos políticos.
Foi o show visual mais impressionante do que esse em 2012. Custa US$ 200 mil por dia (R$ 340 mil), confirmou o chefe de produção da turnê, Chris Kansy. The Wall, do Pink Floyd. É um titã tecnológico. Seis torres gigantes de som circundam o público. Marionetes colossais de mais de 100 metros de altura contracenam com a banda. Um muro continental é construído e demolido.
Ópera-rock de 1979 do grupo britânico Pink Floyd, revisitada sob a batuta do seu compositor, o baixista Roger Waters, levou 80 mil pessoas em duas noites ao Estádio Nacional de Santiago, sexta e sábado. Idealizada há três décadas para espaços fechados, agora foi repaginada para estádios e arenas gigantes. “Dedico esse show a Victor Jara, e a todos os torturados e desaparecidos”, discursou Waters em Santiago. O dramaturgo e poeta Victor Jara foi torturado e fuzilado pela ditadura Pinochet em 1973.
A atualização política do show é tão vertiginosa quanto a metralhadora que Waters dispara na segunda metade do concerto. Uma das canções foi dedicada ao brasileiro Jean Charles de Menezes, assassinado pela polícia britânica com 9 tiros em 2005, ao ser confundido com um terrorista (Waters chega mesmo a cantar seu nome improvisadamente dentro de um verso).
“Há 32 anos, quando escrevi The Wall, acreditava que era minha história. Agora vejo que é algo maior, é de todas as pessoas que lutam contra a guerra. Abarca temas amplos e a luta do indivíduo contra a autoridade”, afirmou, em entrevista coletiva.